sexta-feira, 24 de abril de 2015

Vista submersa de versos poluidos



Jogo pedras na Baia de Guanabara
para tentar afogar a tristeza
ou acordar alguma deusa ou certeza.
Mas Yemanjá se mantem calada...
Me surpreendo com a beleza
que sobrevive, ainda que manchada,
em lotes encurralados da natureza.
Perdidos no horizonte sujo refletido n’agua
entre prédios submersos com luzes acesas
e tartarugas nadando em nuvens de fumaça.

Ao perceber toda essa neblina
que sai de canos de descarga
me esqueço, por um instante de nada,
da minha tristeza e da agonia do mar
e resolvo ascender um cigarro de palha
para ter com quem conversar
ou apenas para conseguir respirar.

Como se me mandando parar de fumar
Dona Janaina finalmente decide se pronunciar,
como sempre sem o silencio desmanchar:
sopra forte sobre meu rosto
um vento salgado que envolve meu corpo
refresca meu peito
e fuma meu cigarro quase todo.

Mas assim como este venenoso hábito
a resposta também dura pouco...
o vento vai diminuindo aos poucos
e de repente seu pouco
já não é nada.
Mas eu continuo ali, feito um louco,
conversando com aquele silencio rouco
com que canta a solidão da madrugada
refletida nas ondas da Guanabara
sobre pedras afogadas,
tartarugas poluídas
e tristezas caladas.



Niterói, Abril de 2015