sábado, 22 de junho de 2013

Meu Muleque





As flores da primavera que vem crescendo em meio ao asfalto e caos da cidade dita Maravilhosa.


Hoje meu filho apareceu na TV.
O vizinho vascaíno que me contou.
E ele que sempre sonhou em ser ator,
quem sabe da novela das nove,
e agora aparecia no Jornal Nacional...
que alegria maior
uma mãe podia ter
de ver seu rebento
tão próximo do sonho
de infância?

Mas não há do que se orgulhar,
Maria,
seu muleque é um dos
vândalos
lá do centro da cidade...

Vândalo?
Meu filho?
Meu guri?
Meu muleque?
Jamais!

Ele foi pra rua,
com uma flor em uma mão
e uma pedra na outra...


punho em riste
e muitos sonhos na cabeça,
e na garganta.

Gritava por Paz, Liberdade, Igualdade...
Lutava pelo Poder do Povo.
Por um mundo,
e não apenas um país,
onde não houvesse exploração
nem violência.
Onde o homem
não fosse mais
seu próprio lobo,
como falaram
de meu muleque,
mas como
mais um
companheiro
de matilha.

Era por isso que
meu menino
marchava.

Por seus sonhos.

Levantava a flor
com o riste punho quando
os verdadeiros
vândalos
chegaram,
com suas bombas
de borracha
e tiros
de pimenta.

Meu filho
trocou
a flor
pela pedra,
que fez voar
na fumaça
no sentido
da repressão.

Pintou nas paredes
e nos muros
seus sonhos,
e gritos.

Gritou por Paz
e sonhou com ela,
mas não recuou
diante da violência
da ditadura
do capital
e lutou
com a garra de Davi
contra o Golias Burguês
e seus porcos fardados.

Com estilingues
e fogueiras de São João
meu guri
se tornou
mais um
na massa,
no povo,
na classe.
E naquela noite
a rua
era deles...
dos moleques
e dos utópicos...
a policia
fugia,
as bombas
eram chutadas
de volta,
ninguém recuava
e nem paravam de cantar.

Fizeram uma festa
e também uma guerra.

A adrenalina
inflamava
a alegria,
a emoção,
o arrepio...
mas
também
a raiva,
o medo,
a vontade de
vingança...

Arrancava
do fundo da garganta
o grito de revolta.
E impulsionava
os corpos,
a flor da pele,
pra cima dos porcos,
pra cima dos bancos,
dos empresários,
dos opressores,
dos inimigos...

Na TV
meu muleque
apareceu
colorindo
um prédio
cinzento
com uma linda
frase
vermelha
de medo
e coragem:
“Não é vandalismo,
é acerto de contas!”

Seguiam
em paz
e em festa,
até o Estado
e suas armas
chegarem.
Alguns lutaram
outros correram
outros quebraram...
Muitos choraram.
Todos gritaram.
Todos gritaram
e sentiram
o grito
de dor
e da raiva
que levou
meu filho
às manchetes
dos jornais.

Vândalo?
Ele só queria
realizar
seus sonhos.

e por isso
ainda
não voltou pra casa.

Eu sei
que ele
só voltará
quando
o mundo
com que
sonha
esteja
nascendo.

Mas para o mundo
de nossos filhos
nascer
é necessária
a morte
do mundo
de nossos
avós.
O mundo
dos verdadeiros
vândalos.

O mundo
do Estado,
da Burguesia,
do Capital,
da fome,
do Mc Donalds
da exploração,
da TV,
da Ditadura,
da Coca-Cola,
da violência...
dos vândalos.

E é por isso
que
meu muleque
está
lá fora,
na TV

e lá estará
enquanto
os vândalos
ainda estiverem
espalhando
suas bombas
de borracha
e porcos
de pimenta.



Niterói, Morro do Estado, 22 de Junho de 2013

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