quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Reflexões de uma Costela

De longe te vi esperando. Estava ascendendo um cigarro, como sempre, enquanto eu tentava esconder o cheiro do meu. Sentamos na mesa de sempre. Pedimos dois chopps e a costela de sempre. O garçom é novo. Você começa a falar. Reclama do meu cabelo. Reclama da atenção que tenho dado a vocês. Reclama do trabalho. Reclama do relacionamento. Reclama do dinheiro. Reclama que cheguei atrasado. Finjo interesse. Coitadinho, um injustiçado mesmo... e eu tão irresponsável.

As reclamações parecem ter cansado. O silencio começa a incomodar. Você parece inquieto. Mais dois chopps, por favor. O bebê da mesa ao lado é tão fofo. Uma gracinha realmente. A costela está demorando, não? Confiro o celular, os minutos foram acrescentados em três. Vou ao banheiro. Vai lá.

Lavo o rosto. Olho pro espelho. Vejo um rapaz de cabelo despenteado, sandália de couro, bermuda cargo e uma blusa do Bob Marley. Uma pseudo-barba ridícula começa a crescer defeituosa e o deixa mais novo ainda. Sorrio ao lembrar-me da sua saudação: “não podia ter posto uma roupa melhorzinha, não?”. O sorriso se apaga. Percebo o quanto o rapaz a minha frente é parecido com você.

Volto à mesa. A costela ainda não chegou. Os chopps foram renovados. O silencio companheiro só é interrompido pelo choro do bebê. Não mais tão fofo. Agora realmente está demorando. Você começa a se irritar, como sempre. Foram matar o animal?

A costela finalmente aparece. Você reclama da demora com o garçom. “Mas senhor, demorou os 20 minutos normais do prato”. Esse bebê não para de chorar? Você podia ter sido menos grosso. Demorou mas ta com cara bonita. O rapaz podia ser seu filho. Não precisava ter sido desrespeitoso.

Comemos como bárbaros. Acompanhados novamente do silencio, agora brigando contra o som dos talheres. Ufa, to cheio, vamos pedir uma saidera? Não, por hoje tá bom. Você ainda vai dirigir. Tá bom então, a conta, por favor. No carro o silêncio cresce. Lembro de como já fomos tão próximos. Tão parecidos. Não só fisicamente... Sorrio novamente. Agradeço ao silencio.

Um comentário:

  1. O que acontecu com aquele menino que só escrevia poesias clichês de amor? Agora escrve como se tivess uma experiência de anos... como estou orgulhosa!
    Ah... que sorte a minha, hein?

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